Direito de greve do servidor público é sinônimo de direito de manifestação?
Ou é apenas um aglomerado de pessoas com cartazes em frente a um órgão público. Ou uma reunião informal de servidores falando seu descontentamento com a determinada circunstância do serviço público.
A greve é o exercício legítimo de reinvindicação de um direito.
O movimento paredista é voluntário (greve), realizado por uma categoria de trabalhadores (servidores) com a finalidade de garantir direitos, melhores condições de trabalho, aumento da remuneração, impedir a redução das verbas salariais e perda de benefícios, dentre outros motivos.
Dito isso, faremos algumas considerações importantes a seguir, a respeito da greve do servidor público, seus limites e garantias legais. Ressaltando que o direito de greve é um direito do servidor assim como o direito ao recebimento de gratificações, progressões e outros direitos do servidor.
DIREITO DE GREVE DO SERVIDOR PÚBLICO: Legislação
A greve é um direito assegurado a todo trabalhador, e nesse sentido, o art. 9º Constituição Federal também dispõe que, cabe a estes decidir em qual momento irão exercer este direito.
O servidor tem liberdade e autonomia para exercer o direito a greve, mas, há a limitação ao exercício desse direito no caso de atividades essenciais, como por exemplo, as atividades relacionadas a saúde.
Assim, a Lei definirá quais são os serviços e atividades essenciais e tratará a respeito do atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade, ou seja, aqueles serviços que não podem deixar de serem prestados, por colocar em risco a vida das pessoas, tal como saúde e segurança.
O art. 10 da Lei 7.783/89, apresenta um rol de serviços ou atividades que são considerados essenciais, separamos alguns exemplos a título de ilustração:
- – tratamento e abastecimento de água; produção e distribuição de energia elétrica, gás e combustíveis;
- – assistência médica e hospitalar;
- – distribuição e comercialização de medicamentos e alimentos;
- – transporte coletivo, controle de tráfego aéreo e navegação aérea e atividades portuárias.
Por conseguinte, cabe mencionar que exercício de greve nesse tipo de atividade essencial tem limitações, a fim de evitar eventuais abusos cometidos na paralisação desses serviços, podendo ser sujeitos a penalidades previstas na lei 7.783/89.
Outrossim, a Constituição Federal ainda versa sobre o direito de greve no art. 37, inciso VII, o qual prevê que o direito de greve deverá obedecer aos limites da legislação especifica.
Portanto, em geral os servidores públicos têm direito ao exercício de greve, disciplinado pela Lei 7.783/89, devendo apenas serem observadas as ressalvadas aplicadas as atividades consideradas essenciais.
DIREITO DE GREVE DO SERVIDOR PÚBLICO: Quando pode ser exercido?
Como já vimos, a greve é direito do trabalhador e é disciplinada pela Lei 7.783/89.
No entanto os tribunais entendem que a lei não é aplicada ao serviço público em sua totalidade, em razão da necessidade especial de determinados serviços da administração pública, o que acaba por atingir o servidor público que atua nas atividades essenciais.
Logo, para determinar como o servidor deve exercer o direito a greve é indispensável observar as peculiaridades do cargo e do serviço desempenhado por ele.
Isso porque a paralisação dos serviços públicos não pode prejudicar o interesse público e a imediata necessidade de terceiros, usuários do serviço público.
Portanto, o direito de greve é uma prerrogativa do servidor público que pode ser exercida como forma de coibir arbitrariedades da Administração Pública em face do funcionário/servidor.
Contudo, esse direito ao movimento paredista tem restrições e requisitos legais, o servidor não pode usufruir de uma greve sem limitações.
Poder Judiciário e o direito a greve
Nesse sentido, destacamos como o TJMA vem se posicionando sobre o direito da greve, vejamos:
ADMINISTRATIVO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE GREVE. INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA DO JUÍZO DE 1º GRAU PARA PROCESSAR E JULGAR FEITOS QUE VISEM A DISCUTIR A LEGALIDADE DE MOVIMENTO PAREDISTA. INTELIGÊNCIA DO JULGADO DO MI 708/DF PELO STF. NULIDADE DECISÃO DE OFÍCIO. 1. Nos moldes da decisão prolatada pelo Pretório Excelso, quando do julgamento doMI 708/DF, resta garantido o direito à greve para todas as categorias – inclusive servidores públicos – e, enquanto não for editada norma específica, deve-se utilizar, por analogia, a Lei n. 7.783/89, que disciplina seu exercício, define as atividades essenciais e regula o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade, com as devidas adaptações, levando-se em conta certas peculiaridades do Serviço Público. (ProceComCiv no(a) AI 018258/2012, Rel. Desembargador(a) JAMIL DE MIRANDA GEDEON NETO, TERCEIRA CÂMARA CÍVEL, , DJe 12/04/2018)
Ainda, a Lei nº 7.783/89 estabelece atos preparatórios ao movimento grevista, que constituem etapa indispensável para o seu início, cuja inobservância implica no exercício abusivo do direito de greve.
Destacamos a seguir quais são os atos de preparação para uma greve ser declarada de formal legal,segundo a legislação são eles:
- esgotamento da via negocial (art. 3º, caput);
- aprovação da greve por deliberação da assembleia-geral da entidade de classe, na forma do seu respectivo estatuto (art. 4º);
- aviso prévio de, no mínimo, 48 (quarenta e oito) horas antes do início da paralisação (art. 3º, parágrafo único),
- ou, ainda, de 72 (setenta e duas) horas, quando se tratar de atividades essenciais (art. 13);
- e manutenção de atividades mínimas, no caso de serviços essenciais (art. 9º e 10)
Logo, para a greve ser declarada legal, devem ser observados esses requisitos mínimos exigidos por norma, tais como: a efetiva frustração da via negocial e o aviso prévio da paralisação com 48h de antecedência, ao menos.
Verifica-se a legitimidade de greve do servidor público, desde que observados os aspectos legais, tais como a continuidade dos serviços essenciais ou atividades inadiáveis, notificação da Administração sobre a paralização com no mínimo 48 horas de antecedência ou 72 horas nos casos de atividades essenciais, especificando os motivos da paralisação.
Sem essa notificação prévia, a greve pode prejudicar terceiros que não poderiam ser responsabilizados pela manifestação do servidor.
Por essas razões o movimento paredista deve observar os atos preparatórios mencionados sob pena de gerar transtornos e ser considerado como uso abusivo do direito de greve.
ASSÉDIO MORAL E DIREITO DE GREVE DO SERVIDOR PÚBLICO
Agora que sabemos como funciona o direito a greve pelo servidor e quais requisitos ele deve ter para ter seu uso autorizado, devemos abordar sobre os excessos que o Poder Público pode cometer ao tentar regular uma greve.
O direito a greve deve ser respeitado e por isso exercido com liberdade e autonomia nos termos da lei, não cabendo ao órgão criar regramentos novos para o seu exercício ou exigir condições para o servidor.
Por isso, se a Administração exigir alguma contraprestação por parte do servidor, pode restar configurada um ato abusivo ou até ato de assédio contra o servidor grevista.
O grevista não pode ser obrigado a fazer horas extras durante o movimento paredista, nem ser coagido a assumir carga horária de outros professores que já aderiram à greve, ou ter a sua greve restringida a determinado horário ou qualquer outra condição.
As vezes esses atos arbitrários dos gestores são destinados aos servidores mais frágeis, como os contratados ou aos que estão em estágio probatório, mas, esses servidores não podem ser proibidos de aderir à greve pela sua situação funcional não gozar da garantia da estabilidade no cargo.
Assim como, os servidores não estáveis não podem sofrer pressão ou constrangimento de que poderiam ser exonerados por razão de greve, pois isso seria uma retaliação ao seu direito de greve e amplamente ilegal.
Por outro lado, essa regulação da greve pelo gestor pode acontecer de forma velada, sob a forma de avisos, afirmações indiretas acerca de prejuízos ou até mesmo sobre negativas de requerimentos administrativos que o servidor tenha feito, como pedido de pagamentos de verbas antigas.
Dessa forma, se o servidor vier a sofrer constrangimento ou ameaças de não receber algum direito que é devido e que seria suspenso pela adesão a greve, pode ocorrer a configuração de assédio moral pelo gestor.
Diante de algum ato relatado acima, o servidor pode registrar um B.O, notificar a sua regional ou entrar em contato com a ouvidoria do órgão para documentar a queixa e notificar a administração do assédio sofrido, para que as providências cabíveis possam ser tomadas.
SERVIDORES TEMPORÁRIOS, EM ESTÁGIO PROBATÓRIO, CARGO COMISSIONADO OU FUNÇÃO DE CONFIANÇA TEM DIREITO A GREVE TAMBÉM?
Assim como o servidor efetivo, os servidores temporários, em estágio probatório e aqueles em cargo comissionado ou função de confiança também possuem legitimidade para reivindicar seus direitos em greve, respeitando a continuidade da prestação de serviços inadiáveis e os ditames da Lei 7.783/89.
É ilegal qualquer portaria, resolução interna ou circular que proibida os servidores contratados ou em estágio probatório de exercerem o seu direito de aderir ao movimento grevista.
De igual modo, não é cabível cláusula contratual que proibida o servidor temporário de exercer seu direito a greve ou regra que permita a exoneração de servidor não estável ou contratado que participe de greve.
Tais proibições ao exercício da greve são ilegais e arbitrárias.
Logo, o servidor temporário/contratado ou servidor que ainda não seja estável não pode ser impedido de participar de greve ou mesmo sofrer censura por exercer esse direito constitucional.
O SERVIDOR EM GREVE PODE SOFRER FALTAS E DESCONTOS NO SALÁRIO?
A Lei dispõe que antes de realizar a greve, deve haver a tentativa de negociação entre os envolvidos a respeito das reinvindicações. Desse modo, não havendo acordo entre as partes é facultado o direito de greve.
Cabe destacar que durante o período de paralisação, os contratos de trabalho serão suspensos e as obrigações de fazer (empregado) e pagar (empregador), serão regidas pelo acordo, convenção, laudo arbitral ou decisão da Justiça.
Outra observação importante a respeito da remuneração do servidor é o corte de ponto e o decesso remuneratório em razão da paralização, vejamos o entendimento do STF:
DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO EM MANDADO DE SEGURANÇA. GREVE DE SERVIDORES PÚBLICOS DO MPU E CNMP. DESCONTO DOS DIAS PARADOS. 1. O STF fixou, em regime de repercussão geral, a seguinte tese: A administração pública deve proceder ao desconto dos dias de paralisação decorrentes do exercício do direito de greve pelos servidores públicos, em virtude da suspensão do vínculo funcional que dela decorre, permitida a compensação em caso de acordo. O desconto será, contudo, incabível se ficar demonstrado que a greve foi provocada por conduta ilícita do Poder Público (STF – AgR MS: 33757 DF – Relator: Min. ROBERTO BARROSO)
Se a fundamentação da greve não for uma conduta ilícita praticada pelo Poder Público, estando fundado unicamente no direito de movimento grevista, haverá a possibilidade de desconto de dias não trabalhados pelo servidor.
À vista disso, podemos compreender que a Administração Pública realizará o desconto na remuneração do servidor durante os dias de greve, em consequência da suspensão do contrato, sendo permitida a compensação em caso de acordo.
De outro modo, o desconto não será cabível se restar demonstrado que a greve ocorreu por conduta ilícita do Poder Público.
Acerca disso, vemos que o TJMA tem julgado contra os descontos por faltas em greve baseada em ato ilegal do poder público, sendo patente a conduta ilícita perpetrada pelo poder público, não há espaço para eventuais descontos remuneratórios dos dias de paralisação
Portanto, verifica-se que se a greve for realizada em conformidade com o que dispõe a Lei nº 7.783/89, o servidor estará em pleno exercício do seu direito, sem poder sofrer descontos salariais.
Além do mais, como já mencionado anteriormente, se o motivo da greve decorrer por parte de conduta legal da Administração Pública, os descontos serão considerados devidos.
Embora o direito à greve seja constitucionalmente garantido, o servidor participante do movimento de paralisação não está livre das consequências advindas do exercício desse direito, estando sujeito ao desconto na remuneração pelos dias não trabalhados e apuração de responsabilidade administrativa pela ausência ao posto de trabalho (STF, Tema nº. 531 em Repercussão Geral e ADINs nº. 1306 e nº. 1335).
De todo modo, poderá ser feita uma apuração de responsabilidade pela paralisação, para analisar se a greve foi realizada de forma correta e conforme a autorizado pela lei.
CONCLUSÃO: Direito de greve do servidor público
Conforme tudo que já foi dito até aqui, podemos compreender que a greve é um direito social, logo é direito tanto do trabalhador da iniciativa privada quanto dos servidores públicos.
Ademais, concluímos que o procedimento para o servidor realizar a greve, é complexo e deverá ser exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica, qual seja, Lei 7.783/89.
Portanto, se você é servidor público e pretende exercer o direito de greve por determinado motivo, procure um advogado de sua confiança para que ele possa lhe auxiliar de maneira adequada, pois a inobservância das normas, pode constituir abuso do direito de greve.