A pessoa com deficiência (PcD), enquanto cidadão, pode prestar serviços no setor público e, por isso, possui direitos como o de concorrer a vagas exclusivas em concursos públicos e condições especiais para prestar o certame.
Saiba os detalhes acerca destes direitos e o que fazer para exercê-los.
A realidade do preconceito que atinge as pessoas com deficiência se faz presente em todas as esferas socias, inclusive, no âmbito do mercado de trabalho e até nos certames públicos.
Na verdade, o PcD não concorre no certame em igualdade de condições no concurso, pois em razão de suas limitações físicas ele tem desvantagens em comparação aos outros candidatos . Por isso o legislador prevê uma tratamento diferenciado ao candidato deficiente como forma de equilibrar os concorrentes e diminuir a disparidade no certame.
O tratamento especial ao PcD é um direito assegurado pela legislação e deve ser exigido!
Muitos candidatos tem deficiências em algum nível, mas não tem certeza se possuem direitos especiais em concursos, como os casos dos portadores de visão monocular, aqueles com perda de audição parcial, o autista, entre outros.
A seguir, você vai saber quem são os candidatos que podem ser enquadrados como PcD para concorrer as cotas reservadas aos deficientes em concurso.
Por esta razão, existem políticas afirmativas concretizadas em leis que garantem o direito das pessoas com deficiência de serem inseridas no campo do trabalho, possibilitando-as ocuparem cargos e empregos públicos.
Caso você esteja em dúvida se pode ou não concorrer a vagas para pessoa com deficiência em certame, a leitura deste artigo trará os esclarecimentos necessários acerca desta temática.
Direitos da pessoa deficiente em concursos públicos: a reserva de vagas e a Constituição Federal
A Constituição Federal, em seu art. 37, inciso VIII, confere à pessoa com deficiência o direito a reserva de um percentual dos cargos e empregos públicos:
Da leitura deste dispositivo não é possível saber qual o percentual exato. Isto porque, como o próprio enunciado legal menciona, é necessário que uma lei regule a matéria.
Assim, temos outras normas para regulamentarem a cota para PcD, como as Leis 8.112/1990 e os Decretos 3.298/99 e 9.508/2018 disciplinando a temática de maneira específica.
Direitos da pessoa deficiente em concursos públicos: percentual das vagas para pessoa com deficiência
Todo concurso deveria ter reserva de vaga para os candidato deficientes, tanto em certames federais como em concursos municipais.
A Lei federal nº 8.112/90 estabelece o percentual máximo de 20% das vagas oferecidas em concursos:
Art. 5º, § 2o Às pessoas portadoras de deficiência é assegurado o direito de se inscrever em concurso público para provimento de cargo cujas atribuições sejam compatíveis com a deficiência de que são portadoras; para tais pessoas serão reservadas até 20% (vinte por cento) das vagas oferecidas no concurso.
Sobre a existência de percentual mínimo, o Decreto 9.508/2018 estabelece o quantitativo de 5%:
Art. 1º, § 1º Ficam reservadas às pessoas com deficiência, no mínimo, cinco por cento das vagas oferecidas para o provimento de cargos efetivos e para a contratação por tempo determinado para atender necessidade temporária de excepcional interesse público, no âmbito da administração pública federal direta e indireta.
Nota-se que ao estabelecer um percentual máximo e mínimo, a lei confere liberdade à Administração para fixar a quantidade de vagas que serão ofertadas, dentro desses parâmetros das leis.
É importante mencionar que estes percentuais dizem respeito a concursos de âmbito federal, sendo cada Estado e Município livre para estabelecer suas regras acerca da reserva de vagas para PcD.
Se o ente federativo (Estado e Município) não dispor de legislação local regulamentando o percentual de vagas para o cotista, mesmo na falta dessa regra poderia ser aplicada a reserva de vagas ao PcD, por conta dessa omissão pode ser aplicada a norma federal – lei 8112/90.
Direitos da pessoa deficiente em concursos públicos: tipos de deficiências que asseguram a condição de PCD
A Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência (Decreto 3.298/99) considera como PcD aqueles que se encaixam nas seguintes categorias:
- I – Deficiência Física – alteração completa ou parcial de um ou mais segmentos do corpo humano, acarretando o comprometimento da função física, apresentando-se sob a forma de paraplegia, paraparesia, monoplegia, monoparesia, tetraplegia, tetraparesia, triplegia, triparesia, hemiplegia, hemiparesia, ostomia, amputação ou ausência de membro, paralisia cerebral, nanismo, membros com deformidade congênita ou adquirida, exceto as deformidades estéticas e as que não produzam dificuldades para o desempenho de funções;
- II – Deficiência Auditiva – perda bilateral, parcial ou total, de 41 decibéis (dB) ou mais, aferida por audiograma nas frequências de 500HZ, 1.000HZ, 2.000Hz e 3.000Hz
- III – Deficiência Visual – cegueira, na qual a acuidade visual é igual ou menor que 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica; a baixa visão, que significa acuidade visual entre 0,3 e 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica; os casos nos quais a somatória da medida do campo visual em ambos os olhos for igual ou menor que 60º; ou a ocorrência simultânea de quaisquer das condições anteriores;
- IV – Deficiência Mental – funcionamento intelectual significativamente inferior à média, com manifestação antes dos dezoito anos e limitações associadas a duas ou mais áreas de habilidades adaptativas, tais como: a) comunicação; b) cuidado pessoal; c) habilidades sociais; d) utilização dos recursos da comunidade; e) saúde e segurança; f) habilidades acadêmicas; g) lazer; e h) trabalho;
- V – Deficiência Múltipla – associação de duas ou mais deficiências
Portanto, o indivíduo que se encaixa em uma destas categorias tem direito a concorrer à concurso público dentro das vagas destinadas à pessoa com deficiência.
Cabe destacar por último, que existem outros indivíduos que podem ser reconhecidos como PCD, não previstos no Decreto 3.298/99, segundo destacaremos.
Direitos da pessoa deficiente em concursos públicos: Autista é considerado PcD?
Alguns candidatos podem ficar inseguros se o seu autismo seria uma condição alcançada pela legislação para assegurar a reserva de vagas em certames e a resposta é:
Sim! O autismo assegura a reserva de vaga ao candidato.
A condição do autismo é prevista em nosso sistema de leis, na Lei nº 12.764 de 2012: “Art. 1º, §2º- A pessoa com transtorno do espectro autista é considerada pessoa com deficiência, para todos os efeitos legais.“
Logo, o autista pode e deve concorrer às vagas para pessoas com deficiência em concursos públicos.
O Superior Tribunal de Justiça e a definição de visão monocular e da surdez unilateral
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) possui entendimento consolidado no que diz respeito aos casos de pessoas com visão monocular ou surdez unilateral poderem concorrer ou não dentro das vagas destinadas à PcD.
A cegueira unilateral e surdez unilateral são temas sumulados no STJ (pacificados).
De acordo com a súmula 377 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), “o portador de visão monocular tem direito de concorrer, em concurso público, às vagas reservadas aos deficientes.”
No que diz respeito à surdez unilateral, o STJ, em sua súmula 552, entende que “o portador de surdez unilateral não se qualifica como pessoa com deficiência para o fim de disputar as vagas reservadas em concursos públicos.”
Como concorrer dentro das vagas destinadas à pessoa com deficiência?
Se você atende aos critérios legais e deseja prestar concurso público dentro das vagas de PcD, é preciso comprovar a existência de sua deficiência.
Os editais preveem a necessidade de anexar, no ato da inscrição, o laudo médico que demonstre o grau e o tipo da deficiência, e especifique o código de Classificação Internacional de Doenças (CID).
Caso a solicitação da inscrição como PcD seja indeferida, é possível ingressar com recurso questionando a negativa e, se o recurso não for acatado, o candidato terá direito à ampla concorrência no certame.
Se o candidato que concorreu dentro das vagas para PcD for aprovado, será convocado, nos termos do Decreto 9.508/2018, a realizar uma avaliação biopsicossocial composta por ao menos 3 profissionais especialistas e atuantes nas áreas das deficiências que o candidato possuir, dentre os quais 1 deverá ser médico, e ter profissionais da carreira a que concorre o candidato.
O candidato deverá levar toda a documentação solicitada no edital do certame.
A avaliação verificará a qualificação do candidato como pessoa com deficiência. Se o candidato não for aprovado na avaliação e possuir pontuação suficiente, poderá figurar na lista de classificação geral.
No entanto, nada impede que o candidato discuta o resultado administrativamente ou mesmo ingresse com uma ação judicial.
Direitos da pessoa deficiente em concursos públicos: o que mais o PcD pode exigir durante o certame
A reserva de vagas é um direito bastante conhecimento pelos candidatos que possuem deficiências, mas eles pode exigir condições diferenciadas para a realização da prova, que seja justificável pela sua saúde.
Algumas das condições especiais que podem ser solicitadas para a realização das provas de concurso público, são:
- Prova ampliada: prova com fontes e imagens maiores para candidatos com limitação visão;
- Prova em Braile: prova inteira em braile para candidatos com deficiência visual;
- Auxílio Ledor: serviço de leitura da prova do concurso para candidatos com deficiência intelectual, visual, autismo, déficit de atenção ou dislexia;
- Acesso Fácil: local de prova com acessibilidade garantida para candidatos com mobilidade reduzida;
- Auxílio Transcrição: pessoa designada para auxiliar o candidato impossibilitado de escrever ou ter a habilidade manual prejudicada;
- Tradutor Intérprete de Língua Brasileira de Sinais: suporte dado aos candidatos mudos e surdos.
- Tempo Adicional: depende da limitação do candidato, de acordo com o laudo médico.
Além destas, caso o laudo indique a necessidade de outra condição especial, é possível a indicação pelo PcD e solicitação tal condição em formulário específico.
O Supremo Tribunal Federal e a possibilidade de realização de provas em condições especiais ao PcD
É possível que a pessoa com deficiência solicite atendimento especial para realização da prova. Tal possibilidade assegura a igualdade de condições com os demais candidatos.
O direito ao atendimento especial foi reforçado pelos Supremo Tribunal Federal (STF) que, inclusive, têm entendido pela adaptação de todas as fases do certame, inclusive da etapa de prova física:
EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. CONCURSO PÚBLICO. DECRETO QUE EXCLUI A ADAPTAÇÃO DE PROVAS FÍSICAS PARA CANDIDATOS COM DEFICIÊNCIA. MEDIDA CAUTELAR CONCEDIDA (…) 4. O art. 4º, § 4º, do Decreto nº 9.508/2018, que estabelece que os critérios de aprovação nas provas físicas poderão ser os mesmos para candidatos com e sem deficiência, somente é aplicável às hipóteses em que essa exigência for indispensável ao exercício das funções próprias de um cargo público específico. É inconstitucional a interpretação que submeta candidatos com e sem deficiência aos mesmos critérios nas provas físicas, sem a demonstração da sua necessidade para o desempenho da função pública. (SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – MEDIDA CAUTELAR NA AÇÃO DIREITA DE INCONSTITUCIONALIDADE: ADI 6476 DF XXXXX-19.2020.1.00.0000)
Nota-se a proteção conferida à pessoa com deficiência contra critérios indiscriminados de avaliação física. O candidato com deficiência só poderá ser submetido aos mesmos parâmetros avaliativos dos candidatos sem deficiência em casos específicos, do contrário deverá haver a devida adaptação.
Como exemplo de adaptação podemos citar a prova ampliada ou em braile para candidatos com baixa ou nenhuma visão; presença de tradutor intérprete de Língua Brasileira de Sinais para auxiliar os candidatos mudos e/ou surdos; e ainda serviço de leitura da prova para candidatos com deficiência intelectual.
Semelhante ao procedimento realizado para concorrer dentro das vagas reservadas para PcD, o candidato deve solicitar tais auxílios no momento da realização de sua inscrição, anexando todos os documentos que comprovem a sua condição e necessidade de adaptação.
Direitos da pessoa deficiente em concursos públicos: a reserva de vagas e condições especiais para prova
Existe direito amparado por lei e reforçado pelos grandes tribunais do país que garante a participação da pessoa com deficiência em concurso público.
A pessoa com deficiência pode participar do certame concorrendo dentro das vagas reservadas, como também pode solicitar a realização das provas em condições especiais.
É importante estar atento aos procedimentos fixados em lei e nos editais no que diz respeito ao procedimento a ser realizado para que se consiga concorrer como PcD a cargo ou emprego público.
Caso sua inscrição como PcD seja indeferida ou caso seja aprovado dentro das vagas reservadas, mas não tenha conseguido obter êxito no teste biopsicossocial, há a possibilidade de recorrer administrativamente ou ainda contar com a ajuda de um advogado para ingressar com ação judicial.
A pessoa com deficiência é cidadã e, por isso, deve ser devidamente incluída em todas as esferas sociais, inclusive no âmbito do mercado de trabalho. Por isso, se você deseja concorrer a cargo ou emprego público e se encaixa nos parâmetros legais, não abra mão do seu direito.